Recebido: 28-02-2022 | Aprovado: 20-06-2022
Cristina Nunes, Centro de Investigação em Psicologia (CIP),
Universidade do Algarve (csnunes@ualg.pt)
Lara Ayala-Nunes, Department of Psychiatry, University of Oxford,
Warneford Hospital (lara.ayala88@gmail.com)
Pedro Pechorro, Escola de Psicologia, Universidade do Minho
(ppechorro@gmail.com)
Mariana Dias, Universidade do Algarve (marianagomesdias@gmail.com)
Laura Inês Ferreira, Centro de Investigação em Psicologia (CIP),
Universidade do Algarve (liferreira@ualg.pt)
Cátia Martins, Centro de Investigação em Psicologia (CIP), Universidade
do Algarve (csmartins@ualg.pt)
Como citar este artigo:
Nunes, C., Ayala-Nunes, L., Pechorro, P., Dias, M., Ferreira, L. I., & Martins, C. (2023). Inventário de Aliança Parental (PAI): Características psicométricas com famílias em risco psicossocial.
RevistaMultidisciplinar, 5(1), 35-53.
https://doi.org/10.23882/rmd.23107
Resumo: A aliança parental diz respeito ao grau de cooperação existente entre os progenitores na educação das crianças. É uma dimensão fundamental para o funcionamento familiar adequado, particularmente em famílias em risco, que enfrentam desafios acrescidos. Esta investigação teve como objetivo validar e examinar as caraterísticas psicométricas do Inventário de Aliança Parental (PAI), uma das medidas mais utilizadas para avaliar este constructo, utilizando uma amostra de famílias portuguesas em risco psicossocial. Participaram 273 famílias com crianças recetoras de medidas de apoio e proteção, residentes no Algarve. Os progenitores preencheram o PAI e outros instrumentos destinados à avaliação das competências parentais e do stresse parental. A análise fatorial confirmatória replicou a versão unidimensional da escala original, com bons indicadores psicométricos de consistência interna e validade de constructo. Os resultados corroboram a utilidade e confiabilidade do PAI como uma medida fiável que poderá auxiliar os técnicos dos serviços de preservação familiar.
Palavras-chave: Aliança Parental, Análise Fatorial Confirmatória, Em Risco, Família, Psicossocial.
Introdução
A aliança parental refere-se ao grau de compromisso e cooperação entre os pais
para a educação e prestação de cuidados aos filhos (Abidin & Brunner, 1995),
englobando as componentes interpessoais de entreajuda, comunicação e
envolvimento por parte dos dois progenitores no exercício da parentalidade
(Feinberg, 2002; Kwan et al., 2015). Este construto tem sido associado ao
funcionamento e ajustamento familiar e infantil (Camisasca et al., 2015;
Margolin et al., 2001; Morrill et al., 2010), com repercussões no estilo de
vinculação da criança e o aparecimento de problemas de comportamento na infância
(McDaniel et al., 2017). Considerando os desafios que as famílias têm na
atualidade (e.g., Gonçalves et al., 2019; Rocha & Nunes, 2021), a existência de
entreajuda e comunicação parecem ser ingredientes de relevo no seu quotidiano.
Uma aliança parental coesa parece fornecer aos pais os recursos necessários para
exercer as suas funções parentais de forma eficaz e de modo a que coordenem os
seus papéis parentais em benefício da criança (Behnke et al., 2008; Feinberg,
2002;
Menéndez et al., 2011) e, simultaneamente, a coesão de todo o sistema familiar
(García-Méndez et al., 2006). A forma como os pais organizam em conjunto o
cuidado à criança está significativamente relacionada com o ajustamento
psicossocial da mesma, o que leva a considerar a aliança parental como um
preditor significativo do ajustamento psicológico da criança (Barreto
et al., 2019; Teubert & Pinquart, 2010).
A literatura científica na área tem mostrado evidências de uma forte relação de
influência mútua entre a qualidade do relacionamento conjugal e a perceção de
aliança parental (Kwan et al., 2015; Margolin et al., 2001). Posto isto, níveis
inferiores de aliança parental surgem, muitas vezes, associados a baixa
satisfação na conjugalidade. Nestes casos, tem-se vindo a verificar um efeito de
contágio nos pais, embora não nas mães, no qual os problemas de casal acabam por
afetar o desempenho do papel parental, com menor envolvimento e um estilo menos
democrático (Camisasca et al., 2019; Morril et al., 2010). Por sua vez, a baixa
qualidade da relação de casal (tanto como cônjuges como enquanto pais) aparece
frequentemente relacionada com perturbações no comportamento das crianças, menor
bem-estar psicológico, baixo desempenho académico e apego à família (Camisasca
et al., 2019; McDaniel et al., 2017; Teubert & Pinquart, 2010).
Estas inter-relações adquirem especial importância nas famílias em risco
psicossocial que, por circunstâncias diversas, tanto pessoais como ambientais,
não conseguem assegurar adequadamente o desenvolvimento e o bem-estar da criança
(Nunes et al., 2019). Estas famílias estão expostas a um elevado número de
fatores de risco que aumentam os seus níveis de stresse, diminuindo a satisfação
marital, aspetos que influenciam a aliança parental (Ayala-Nunes et al., 2016;
Ayala-Nunes et al., 2017; Belsky & Jafee, 2015).
Por outro lado, uma forte aliança parental, após uma separação ou divórcio, está
associada a um maior envolvimento paterno, o que mitiga os efeitos negativos da
dissolução do relacionamento dos pais. Nos casos de famílias em risco
psicossocial, que são mais propensas a sofrer a dissolução dos relacionamentos,
uma forte aliança parental após a separação é particularmente importante
(Rodrigo et al., 2007). Ayala-Nunes e colegas (2014) conduziram uma investigação
com 80 mães de uma amostra em risco psicossocial portuguesa, com o intuito de
examinar a relação entre a aliança parental e outros variáveis relacionados com
fatores socioeconómicos, familiares e da criança. Os resultados deste estudo
mostraram que uma baixa aliança parental está negativamente associada ao número
de filhos e positivamente associada a maior insatisfação na relação conjugal,
mais conflitos entre o casal e menor envolvimento na parentalidade. Estes dados
apontam para a necessidade de uma maior análise da aliança parental no contexto
português (Ayala-Nunes et al., 2014), para que possa haver uma intervenção
adequada em todos os domínios deficitários do funcionamento destas famílias em
risco.
Além disso, a aliança parental figura, assim, como uma dimensão relevante na
ecologia parental e útil tanto para o estudo do sistema familiar como para
avaliar as necessidades de apoio e intervenção, sendo necessário que
investigadores e profissionais disponham de instrumentos válidos, fiáveis e
adaptados à população portuguesa.
No entanto, existem poucos instrumentos validados para a população portuguesa
que avaliem a aliança parental ou a coparentalidade. Encontrámos apenas três
publicados: uma versão reduzida com seis itens do Parenting Alliance Measure
(PAM, Abidin & Konold, 1999) realizada por Lamela e colegas (2013), uma
adaptação do Coparenting Questionnaire (Margolin et al., 2001) realizada por
Pedro e Ribeiro (2015) e uma versão preliminar de Pinheiro e Lemos (2013) do
Parenting Alliance Inventory (PAI), todas realizadas com população geral.
O PAI, desenvolvido por Abidin e Brunner (1995), é um instrumento de autorrelato
que avalia a aliança parental e a relação de apoio e confiança que existe no
casal como progenitores. É composto por 20 itens avaliados numa escala de Likert
do 1 (“discordo muito”) ao 5 (“concordo muito”), sendo unidimensional, onde os
resultados mais elevados correspondem a uma perceção mais positiva da aliança
parental. O facto de poder ser aplicado independentemente da situação conjugal
ou da pessoa que exerce as funções parentais ser ou não o pai biológico do
menor, e ser de acesso livre, são as suas maiores vantagens.
A primeira validação desta escala foi realizada com uma amostra de 512 pais, 321
mães e 191 pais, em conjunto com 78 professores/prestadores de cuidados infantis
e apresentou uma consistência interna elevada, com um alfa de Cronbach de .97.
Os resultados mostraram diferenças significativas entre as mães casadas,
separadas, solteiras ou divorciadas, sendo as mães casadas as que apresentam um
índice mais elevado de aliança parental (Abidin & Bruner, 1995). Em França,
Rouyer e colegas (2015) procederam à validação do PAI com uma amostra de 202
pais coabitantes da população comunitária francesa. Nesta versão do inventário,
foi reportada uma estrutura de quatro fatores após a eliminação dos itens 1, 9 e
14. Os fatores propostos pelos autores dizem respeito às semelhanças na perceção
do desenvolvimento infantil, comunicação e concordância quanto à educação da
criança, apoio sentido por parte do outro, e perceção de competência do outro
progenitor. Esta validação apresentou bons índices psicométricos, com alta
consistência interna e validade de construto (Rouyer et al., 2015). Todavia, a
solução fatorial encontrada neste estudo opõe-se à unidimensionalidade
originalmente proposta por Abidin e Bruner (1995), pelo que se recomenda a
análise psicométrica do PAI com outras estruturas familiares e noutros
contextos.
Até à data, que seja do nosso conhecimento, não existe nenhuma versão desta
escala validada e publicada para a população portuguesa. Foi apenas identificado
um estudo preliminar de validação desta escala, de Pinheiro e Lemos (2013),
utilizando uma análise fatorial exploratória com uma amostra de 118 mães da
população geral encontrando uma estrutura unidimensional da escala, com valores
muito elevados de consistência interna (α = .97).
Os objetivos do presente estudo foram analisar e validar através duma análise
fatorial confirmatória a versão portuguesa do Inventário de Aliança Parental
numa amostra de pais em risco psicossocial. Esperamos demostrar (1) a estrutura
unidimensional do Inventário de Aliança Parental, (2) adequada consistência
interna e (3) validade de construto com a medida de
avaliação das competências parentais (PSOC) e do stresse parental (PSI-SF), duas
dimensões relevantes para o funcionamento familiar.
Método
Participantes
Participaram 273 famílias de crianças com idades entre os 0 e os 18 anos, residentes no Algarve (Sul de Portugal), abrangidas por medidas de promoção e proteção nas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens devido à existência de situações de risco, sem gravidade suficiente que necessite de afastamento da família. Os participantes tinham idades compreendidas entre os 19 e os 58 anos de idade (M = 37.05 anos; DP = 8.07), com um baixo nível educativo (52% não tinha completado o ensino básico) e eram maioritariamente mães (82%). Os rendimentos familiares mensais eram em média de 935.68€ (DP = 544.94). A maioria das famílias era biparental (39%), 31% era reconstituída e 30% monoparental (n = 81).
Instrumentos
Inventário de Aliança Parental (PAI): o PAI é um instrumento de autorrelato que avalia a aliança parental e a relação de apoio e confiança que existe no casal enquanto pais e foi desenvolvido por Abidin e Brunner (1995), cujas características já referimos na introdução. A tradução inicial do inglês para o português foi realizada pelas duas primeiras autoras deste estudo, assegurando a compreensão correta do significado dos itens. O questionário foi novamente traduzido para o inglês por um nativo com considerável experiência profissional em tradução de textos científicos de psicologia. A adaptação cultural foi especialmente considerada, tendo em conta a clareza, o uso da linguagem comum e equivalência conceptual da escala. No presente estudo obtivemos um índice de fiabilidade de α = .96.
Escala de Competências Parentais Percebidas (PSOC): esta escala foi desenvolvido por Johnston e Mash (1989), com o intuito de avaliar a competência parental percebida pelos pais em 16 itens, que se subdividem em duas dimensões: eficácia como pai/mãe (Eficácia Parental; EP), composta por 7 itens e a satisfação com o papel parental (SP), composta por 9 itens, numa escala de 1 (“não, totalmente em desacordo”) a 6 “(sim, totalmente de acordo”). A Eficácia avalia em que medida os progenitores se sentem competentes no papel de mãe/pai (ex: “Apesar de ser difícil, eu já sei como se pode influenciar os filhos”). A Satisfação avalia em que medida os progenitores se sentem satisfeitos com o seu papel de pai/mãe (ex: “Com a idade que o meu filho tem, ser mãe não é agradável”). Neste estudo, foi utilizada a versão portuguesa de Nunes e colegas (2016) e obtivemos os seguintes índices de fiabilidade: α = .74 para Eficácia e α = .70 para Satisfação parental.
Índice de Stresse Parental – versão reduzida (PSI-SF): este questionário de autorrelato, desenvolvido por Abidin (1995), foi construído para a avaliação do stresse parental. É constituído por 36 itens, numa escala de 1 (“concordo totalmente”) e 5 (“discordo totalmente”) e divide-se em três subescalas: O Distresse Parental (ex: “Sinto-me limitado/a por causa das minhas responsabilidades como mãe/pai”), a Interação Disfuncional entre o Cuidador e a Criança (ex: “Quando faço coisas pelo meu filho tenho a sensação que o meu esforço não é muito apreciado”) e o grau em que o cuidador avalia o seu filho como uma Criança Difícil (ex: “Parece-me que o meu filho chora mais e faz mais barulho do que a maioria das crianças”). No presente estudo utilizámos a versão portuguesa de Abidin e Santos (2003) e obtivemos os seguintes índices de fiabilidade: α = .87 para o distresse parental, α = .80 para a interação disfuncional entre o cuidador e a criança, e α = .84 para o grau em que o cuidador avalia o seu filho como uma criança difícil.
Procedimentos
Após o estabelecimento de protocolos de colaboração com as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens do Algarve, que intervêm junto destas famílias, os técnicos das instituições colaboradoras selecionaram os progenitores que cumpriam os critérios de inclusão e convidaram-nos a participar no estudo. Posteriormente, entrevistadores treinados para a aplicação dos instrumentos deslocaram-se às instituições para entrevistar os progenitores que tinham concordado em participar. Os participantes foram informados acerca dos objetivos do estudo, do carácter não compensatório da sua participação, da natureza anónima e confidencial das suas respostas e da possibilidade de desistir do estudo em qualquer momento sem que isso representasse quaisquer consequências para eles. Após a assinatura do consentimento informado, os questionários foram aplicados através de entrevista individual entre janeiro e dezembro de 2019. O estudo foi aprovado pelo Conselho Científico da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade do Algarve (CC_55_20/12/2017).
Análise de dados
Os dados foram analisados com o software SPSS v25 (IBM SPSS, 2017). A análise da estrutura fatorial do Inventário de Aliança Parental foi efetuada no software EQS 6.3 (Bentler & Wu, 2015) com estimativa por Máxima Verosimilhança (ML). Os índices de ajustamento foram calculados através do Qui-quadrado de Satorra-Bentler/graus de liberdade, CFI (Comparative Fit Index), IFI (Incremental Fit Index), RMSEA (Root Mean Square Error of Approximation). Os valores CFI ≥ .90 e RMSEA < .10 indicam um ajustamento adequado; os valores de CFI ≥ .95 e RMSEA ≤ .06 indicam um ajustamento bom (Byrne, 2013). Um valor de IFI ≥ .90 é considerado aceitável. A Análise Fatorial Confirmatória (AFC) foi efetuada diretamente nos itens utilizando uma matriz de correlações categorias e valores de cargas fatoriais ≥ .45.
As correlações de Pearson foram utilizadas para analisar as associações entre variáveis escalares (Knapp, 2017). Foram consideradas correlações fracas as correlações entre 0 e .20, correlações moderadas entre .20 e .50, e correlações fortes acima de .50 (Ferguson, 2016). A consistência interna pelo alfa de Cronbach foi considerada adequada acima de .70 e as correlações item-total corrigidas quando acima de .30 (Tabachnick & Fidell, 2019).
Resultados
Análise Descritiva do PAI
A tabela 1 mostra que os participantes têm uma perceção de aliança parental elevada (M = 73.78; DP = 20.02). Os índices de assimetria (-0.74) e de curtose (-0.37) não se afastam muito da normalidade (Sk < 3 e Ku < 10). O PAI apresenta uma consistência interna muito elevada (α = .96). O valor do alfa de Cronbach não se alterava com a exclusão de nenhum dos itens e as correlações entre cada item e a pontuação total da escala oscilaram entre .49 e .87, sendo consideradas adequadas.
Tabela 1
Análise descritiva do PAI e da capacidade
discriminante dos 20 itens originais
Análise Fatorial Confirmatória
Os índices de ajuste revelaram uma boa adequação do modelo
unifatorial, sugerindo que podemos assumir esta estrutura interna. Os valores de
S-Bχ2
/gl (2.33), IFI (.99), CFI (.99) e RMSEA (.07),
encontram-se dentro dos parâmetros necessários (CFI ≥ .90 e RMSEA < .10) e
indicam um ajustamento adequado. Por seu lado,
S-Bχ2
/gl
< 2 ou 3 e IFI ≥ .90 são considerados
aceitáveis (Tabela 2).
Tabela 2
Indicadores da bondade do ajuste do modelo ML
do PAI
Os valores da carga fatorial do modelo unifatorial (Tabela
3) variaram entre .54 (item 2) e .93 (item 13), podendo-se concluir que as
variáveis contribuem de forma significativa para a formação do fator.
Saturações fatoriais dos itens para o PAI
O valor da média das correlações inter-item (.55) foi
aceitável, embora ligeiramente acima dos valores recomendados (entre .15 e .50),
revelando uma boa homogeneidade dos itens. As correlações corrigidas entre o
item e o total (.49 - .87) foram aceitáveis (>.40).
Validade de Construto
Na tabela 4 podemos observar que existem associações
positivas e significativas com ambas as dimensões das competências parentais
percebidas (eficácia e satisfação parental), isto é, uma elevada aliança
parental está associada a uma elevada competência parental percebida.
Observaram-se ainda associações significativas e negativas com todas as
dimensões do stresse parental, isto é, uma baixa aliança parental está associada
a um elevado stresse parental.
Validade de construto do PAI
Discussão
A presente investigação teve como principal objetivo
examinar as caraterísticas psicométricas do Inventário de Aliança Parental
(Parenting Alliance Inventory, PAI) numa amostra de famílias em risco, de modo a
facilitar o conhecimento acerca da validade e fiabilidade da medida quando
aplicada a uma população com maiores desvantagens a nível psicossocial.
Os resultados obtidos através da Análise Fatorial
Confirmatória realizada denotam uma estrutura fatorial unidimensional que vai de
encontro à escala original proposta por Abidin e Brunner (1995). A solução
fatorial encontrada demonstrou indicadores psicométricos favoráveis, com bom
ajuste do modelo de 1 fator. Estes dados suportam a confiabilidade da estrutura
unifatorial original, contrariando a versão de quatro fatores encontrada pela
validação francesa do instrumento, aplicada a uma amostra da comunidade (Rouyer
et al., 2015).
Além disso, verificam-se correlações inter-item adequadas
e elevada consistência interna, com valores de fiabilidade aceitáveis sem que
fosse necessário eliminar qualquer item. Assim, torna-se passível de concluir
que o PAI apresenta uma boa adequação à população em estudo, compondo-se como
uma medida fiável para a avaliação da aliança parental de famílias portuguesas
em risco psicossocial, tal como na investigação de Ayala-Nunes e colegas (2014).
No que diz respeito aos valores médios de aliança parental
reportados pela amostra, as famílias incluídas neste estudo apresentaram um
índice de aliança parental ligeiramente acima da média da escala, o que se opõe
à possível expetativa teórica de que os sujeitos em risco psicossocial pudessem
experimentar baixos níveis de aliança parental, devido às situações stressantes
e às relações conjugais problemáticas que o contexto adverso propicia (Camisasca
et al., 2019). Estes resultados podem ser explicados pelo apoio social prestado
a estas famílias, que poderá estar a agir como um fator protetor e redutor do
stresse parental (Coelho & Ribeiro, 2000; Wills & Shinar, 2000).
Não obstante, a média relatada pelos nossos participantes
foi inferior à dos estudos de Abidin e Brunner (1995) com uma amostra da
comunidade e de Menéndez e colegas (2010) e Hidalgo e colegas (2009), com
famílias espanholas em risco. Já nas investigações desenvolvidas no contexto
português, encontram-se pontuações igualmente mais baixas e semelhantes aos
encontrados na nossa amostra (Ayala-Nunes et al., 2014), embora tal se verifique
maioritariamente em famílias monoparentais (Pinheiro & Lemos, 2013). Estes dados
parecem sugerir que as famílias portuguesas em risco psicossocial apresentam uma
perceção de aliança parental mais baixa do que outras populações, com uma
sensação de menor suporte por parte do companheiro no que diz respeito ao
cuidado da criança e a outras tarefas relacionadas com a parentalidade, do que a
população geral. Neste sentido é importante trabalhar com estas famílias a
aliança parental e os seus componentes, uma vez que esta tem influência no
ajustamento das crianças (Camisasca et al., 2019), podendo
atenuar a situação de risco em que estas vivem.
Relativamente à análise de validade de construto, os
resultados encontrados demonstram uma associação positiva significativa entre a
aliança parental e a perceção de competências parentais. Tal como comprovado por
estudos anteriores (e.g., Kwan et al., 2015), os pais que pontuam para altos
níveis de aliança parental apresentam também uma maior perceção de competência
no desempenho do papel parental, corroborando a existência de uma relação de
influência mútua entre estes dois constructos, em que uma maior cooperação dos
progenitores está associada a maior sentido de eficácia no exercício da
parentalidade (Flouri, 2005; Merrifield & Gamble, 2013). No sentido oposto, o
PAI apresentou uma relação negativa significativa com a medida de stresse
parental, confirmando a sua validade de construto. Conforme reportado por Abidin
e Brunner (1995) e Rouyer e colegas (2015), uma perceção de baixa aliança
parental está interligada a maiores níveis de stresse nos pais, realçando a
necessidade de ter em consideração o construto de aliança parental aquando da
avaliação do funcionamento familiar. Esta avaliação é ainda mais urgente em
famílias em risco psicossocial, cujo contexto adverso apresenta, por si só,
múltiplos fatores de stresse que devem ser alvo de intervenção (Ayala-Nunes et
al., 2014;
Menéndez et
al., 2016).
Em suma, as conclusões do nosso estudo permitem afirmar
que o PAI apresenta boas características psicométricas, com alta confiabilidade
e adequação à população de famílias em risco do contexto nacional português.
Desta forma, comprova-se a utilidade desta medida para a exploração do construto
unidimensional de aliança parental a par de outras variáveis implicadas no
funcionamento do sistema familiar. O PAI é um instrumento de fácil aplicação e
interpretação, que poderá ser vantajoso não só para a exploração científica
desta dimensão, mas também para técnicos e profissionais dos programas de
intervenção e preservação familiar (Nunes et al., 2019; Rubio et al., 2021).
Como proposta de investigações
futuras, sugere-se a replicação deste estudo com uma amostra mais ampla, que
contemple famílias portuguesas de todas as regiões do país e procure incluir
mais progenitores do sexo masculino. Paralelamente, seria pertinente explorar as
diferenças entre tipos de amostra (população em risco e da comunidade) e
considerar a possível variabilidade da escala em distintas composições
familiares (e.g., biparental, monoparental, reconstituída). Além disso, apela-se
à necessidade de recorrer a outros métodos de análise como o teste-reteste ou a
análise item-a-item.
Agradecimentos:
Este estudo foi financiado por fundos nacionais no âmbito do projeto CIP (Refª
UIDB/PSI/04345/2020).
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