Os Vírus são "singulares" e desafiam os paradigmas da Ciência

Autores

DOI:

https://doi.org/10.23882/rmd.22094

Palavras-chave:

vírus, paradigmas, ciência, ecologia, virosfera

Resumo

A história do progresso do conhecimento científico dos vírus demonstra que a tendência dos investigadores para se prenderem a paradigmas e teorias específicas sobre as causas das doenças, não os deixa ver as ameaças de patógenos conhecidos e desconhecidos (Honigsbaum, 2021). É o caso, por exemplo, da “teoria dos germes” da doença, apresentada pelo bacteriologista alemão Robert Koch e o seu colega francês Louis Pasteur, na década de 1880. O paradigma bacteriológico da gripe humana, ao ser defendido por Richard Pfeiffer em 1892, atrasou durante décadas a compreensão da sua etiologia viral. Infelizmente, raro era o homem de ciência que ousava desafiar a autoridade de Koch e dos seus discípulos.
Neste artigo pretendemos contribuir para a elaboração de uma imagem científica dos vírus, confrontando-a, sempre que necessário, com a ontologia da vida quotidiana. Para Dennett (2021), a imagem científica é algo que se tem de aprender na escola, e a maioria das pessoas adquire um conhecimento superficial da mesma. Não obstante, na nossa relação com os vírus, temos que aprender quais as “coisas” a retirar da nossa ontologia da vida quotidiana e quais as novas categorias a introduzir para criar uma ontologia da imagem científica dos vírus, fundamentando a nossa compreensão destas entidades singulares que desafiam os paradigmas científicos. É neste contexto que a abordagem do processo de produção do conhecimento científico tem sido apontada como de fundamental importância para compreender a Ciência, e a Virologia, como atividade humana historicamente contextualizada.

Referências

Agut, H. (2007). La multiplication des virus. Pour La Science, 55, 14-19.

Aires, L. M. (2020). Vírus, Bactérias e Humanos. Ciência e Histórias de uma Coabitação Atribulada. Lisboa: Edições Sílabo.

Baltimore, D. (1970). Viral RNA-dependent DNA Polymerase: RNA-dependent DNA Polymerase in Virions of RNA Tumour Viruses. Nature, 226, 1209-1211.

Calafate, L. C. (1984). Estudo das Implicações da Epistemologia da Ciência na Epistemologia Escolar. (Provas de aptidão pedagógica e capacidade científica, não publicadas). Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Portugal.

Calafate, S. (2021). Vírus de laboratório. Rev. Ciência Elem., V9(2), 031

Chastel, C. (2007). La découverte d’un nouveau monde. Pour La Science, 55, 8-13.

Dennett, D. C. (2021). Das bactérias a Bach e vice-versa. A evolução das mentes. Lisboa: Edições 70.

Diamond, J. (2002). Armas, Germes e Aço. Os Destinos das Sociedades Humanas. Relógio D’Água Editores.

Du, S., Qin, F., Zhang, Z., Tian, Z., Yang, M., Liu, X., Zhao, G., Xia, Q., & Zhao, Y. (2021). Genomic diversity, life strategies and ecology of marine HTVC010P-type pelagiphages. Microbial Genomics, 7, 000596

Dulbecco, R. (1995). “Howard M. Temin, 10 December 1934 – 9 February 1994”. Biographical Memoirs of Fellows of the Royal Society, 41(4), 471-80.

Fuhrman, J. A. (1999). Marine viruses and their biogeochemical and ecological effects. Nature, 399, 541-548.

Honigsbaum, M. (2021). O Século das Pandemias. Amadora: Vogais.

Kuhn, T. (1978). Segundos Pensamentos Sobre Paradigmas. Madrid: Tecnos.

Kuhn, T. (1979). A Função do Dogma na Investigação Científica. In M.M. Carrilho (Ed.) História e Prática das Ciências. Lisboa: A Regra do Jogo.

Kuhn, T. (1980). La estrutura de las revoluciones científicas. Madrid: Fondo de Cultura Económica.

Kupiec, J.-J. (1995). Histoire de vírus, de gènes et de chercheurs. Science et Vie, 193, 56-65.

La Scola, B., Audic, S, Robert, C., Jungang, L., de Lamberie, X., Drancourt, M., Birtles, R., Claverie, J.-M., & Raoult, D. (2003). A Giant Virus in Amoebae. Science, 299, 2033.

Marçal, D., & Fiolhais, C. (2020). Apanhados pelo Vírus. Lisboa: Gradiva.

Maréchal, V. (2007). Virus en emboscade dans l’organisme. Pour La Science, 55, 66-71.

May, R. M., & Anderson, R. M. (1983). Epidemiology and genetics in the coevolution of parasites and hosts. Proc. R. Soc. London, 219, 281-313.

Maynard Smith, J., & Szathmáry, E. (2007). As Origens da Vida. Do Nascimento da Vida às Origens da Linguagem. Lisboa: Gradiva.

Miller, J. (2021). A Vacina: A Inovação de uma Era no combate à COVID-19. Lisboa: ACTUAL.

Misasi, J., & Sullivan, N.J. (2014). Camouflage and Misdirection: The Full-On Assault of Ebola Virus Disease. Cell, 159(3), 477-486.

Oreskes, N. (2021). Porque confiar na ciência? Lisboa: Gradiva.

Parreira, R., & Piedade, J. (2016). Vírus. In W.F.C. Ferreira, J.C.F. de Sousa and N. Lima (Eds.), Microbiologia (pp. 110-129). Lisboa: Lidel.

Philippe, N., Legendre, M., Doutre, G., Couté, Y., Poirot, O., Lescot, M., Arslan, D., Seltzer, V., Bertaux, L., & Bruley, Ch. (2013). Pandoraviruses: Amoeba Viruses with Genomes Up to 2.5 Mb Reaching That of parasitic Eukariotes. Science, 341, 281-286.

Pilorge, T. (1995). Une brève histoire de l’infiniment Petit. Science et Vie, 193: 4-9.

Popper, K. (1978). La Logique de la Découverte Scientifique. Paris: Payout.

Pracontal, M. (1995). Les Gendarmes d’Atlanta contre le vírus. Science et Vie, 193, 80-89.

Sonigo, P. (1995). Durer: l’unique raison d’être des Vírus. Science & Vie, 193, 66-74.

Sullivan, M. B., Weitz, J. S., & Wilhelm, S. (2016). Viral ecology comes of age. Environmental Microbiology Reports, 9(1), 33-35.

Tavares, M. (2007). Gripe. Matosinhos: QuidNovi.

Temin, H. M., & Mituzani, S. (1970). RNA-dependent DNA Polymerase in Virions of Rous Sarcoma Virus. Nature, 226, 1211-1213.

Villarreal, L. (2007). Les vírus sont-ils vivants? Pour La Science, 55, 20-24.

Villarreal, L. (2016). Viruses and the placenta: the essential vírus first view. APMIS, 124, 20-30.

Wilhelm, S. W., & Suttle, C. A. (1999). Viruses and nutrient cycles in the sea-viruses play critical roles in the structure and function of aquatic food webs. Bioscience, 49, 781-788.

Wilson, E. O. (2019). Da Terra Metade. A Luta do Nosso Planeta pela Vida. Porto: Arte E Ciência.

Whitfield, P. (1994). História Natural da Evolução. Lisboa: Verbo.

Zimmer, C. (2021). Um Planeta de Vírus. Porto Salvo: Desassossego.

Downloads

Publicado

2022-02-20

Como Citar

Calafate, L. (2022). Os Vírus são "singulares" e desafiam os paradigmas da Ciência. [RMd] RevistaMultidisciplinar, 4(2), 117–133. https://doi.org/10.23882/rmd.22094